Marcella de Melo Faria
Imagem: Ismeta Gruenwald |
Adriana Lisboa é autora de romances e livros
infanto-juvenis, além de poeta e contista. Nasceu no Rio de Janeiro, morou também
na França e na Nova Zelândia e atualmente vive nos Estados Unidos. Ela é mestra
em literatura brasileira e doutora em literatura comparada pela UERJ, além de
ter sido pesquisadora visitante nas Universidades de Kyoto, do Texas e do Novo
México. Seus livros foram
publicados em catorze países e traduzidos para diversos idiomas, tais como: inglês,
francês, espanhol, alemão e árabe. Seu reconhecimento chegou a ser tão grande
que recebeu diversos prêmios, como por exemplo, o Prêmio
José Saramago,
em Portugal, pelo romance Sinfonia em
branco; o Prêmio Moinho
Santista, no Brasil, pelo conjunto de seus romances; e o prêmio de autor
revelação da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil por Língua de trapos.
Azul Corvo, publicado em 2010, é um de seus
romances mais conhecidos. Esta obra retrata a trajetória de Vanja, uma menina
de 13 anos que se muda para os Estados Unidos para morar com Fernando – ex-guerrilheiro
e ex-marido de sua recente falecida mãe –, que promete ajudar Vanja a encontrar
seu pai americano que nunca conhecera. A melancolia é o que une os dois
personagens, que acabam criando laços afetivos capazes de durar uma vida
inteira e os ajudar nos seus respectivos processos de amadurecimento diante dos
tristes acontecimentos que suas vidas lhes proporcionaram até então. Ao mesclar
mobilidades culturais à brevidade de relacionamentos afetivos e da própria
vida, Adriana Lisboa nos oferece reflexões acerca da existência humana.
Genericamente, a figura do corvo está associada a maus presságios devido
à sua cor negra. Nesse sentido, Vanja pode ser vista como uma ave que voa para
lugares distintos e essa jornada é também uma viagem interna na qual a
personagem conhece a si mesma. Ela acaba se tornando uma ave azul e não negra
como poderia se esperar de uma garota estrangeira, órfã, sem muitas condições, vivendo
nos Estados Unidos. No seu processo de amadurecimento e de encontro à
felicidade ela adquire coloração.
Pode-se dizer que Azul Corvo
retrata uma história de amizades que não escolhem nacionalidade, sexo, idioma
ou idade. A migração é um tema recorrente na obra, visto que o desejo de
mudança é um traço comum entre as personagens. A escritora também explora fatos
históricos que ocorreram no Brasil, como a Guerrilha do Araguaia. Ademais, a obra versa sobre a
diáspora atual acentuando-se questões importantes e profundas sobre a
experiência humana diante de uma realidade cultural heterogênea e mesclada. O
deslocamento das personagens pode ser visto como uma busca de identidade,
proporcionando-lhes tanto o autoconhecimento como o conhecimento do outro. Ao
buscar seu pai biológico Vanja conhece outras pessoas que contribuem para a
construção de sua própria identidade e para o seu processo de amadurecimento.
Ao fazer uso de uma linguagem simples, porém poética, Adriana Lisboa
narra uma belíssima história que oscila entre presente e flashbacks. Essa variação no tempo permite uma reflexão entre o passado
e o presente, que nos leva a ponderar como as nossas escolhas constroem nosso
futuro.
Por fim, é importante realçar que Azul
Corvo é também uma história sobre nós que estamos imersos numa pluralidade
de culturas e que muitas vezes ignoramos nossas diferenças e nos distanciamos
dos valores humanos. Assim sendo, as palavras de Heitor Ferraz, colocadas na
epígrafe da obra de Lisboa, merecem destaque: “Somos todos estrangeiros. Nesta cidade. Neste corpo que acorda”. Transitar,
conhecer pessoas, conhecer-se. Existir é isso!
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